domingo, 9 de março de 2008

Amor


Um horror grande e mudo, um silêncio profundo.
No dia do pecado amortalhava o mundo.
E Adão, vendo fechar-se a porta do Éden, vendo que Eva olhava o deserto e hesitava tremendo,Disse:Chega-te a mim! entra no meu amor,E à minha carne entrega tua carne em flor!Preme contra meu peito teu seio agitado,
E aprende a amar o Amor renovando o pecado!
Abençôo o teu crime, acolho o teu desgosto
Bebo-te, de uma em uma, as lágrimas do rosto!
Vê! Tudo nos repele!
A toda a criaçãosacode o mesmo horror e a mesma indignação...
A cólera de Deus torce as árvores, cresta
Como um tufão de fogo o seio da floresta,
Abre a terra em vulcões, encrespa a água dos rios;
As estrelas estão cheias de calafrios;
Ruge soturno o mar; turva-se hediondo o céu...
Vamos! Que importa Deus?
Desata, como um véu,
Sobre a tua nudez a cabeleira! Vamos!
Arda em chamas o chão; rasguem-te a pele os ramos;
Morda-te o corpo o sol; injuriem-te os ninhos

Surjam feras a uivar de todos os caminhos;
E, vendo-te a sangrar das urzes através,
Se emaranhem no chão as serpes aos teus pés...
Que importa? O Amor, botão apenas entreaberto,
Ilumina o degredo e perfuma o deserto!
Amo-te! sou feliz! Porque, do Éden perdido,Levo tudo, levando o teu corpo querido!
Pode em redor de ti, tudo se aniquilar:
Tudo renascerá cantando ao teu olhar,
Tudo, mares e céus, arvores e montanhas,
Porque a Vida perpétua arde em tuas entranhas!
Rosas te brotarão da boca, se cantares!
Rios te correrão dos olhos, se chorares!
E se, em torno ao teu corpo encantador e nu,
Tudo morrer, que importa?
A natureza és tu,
Agora que és mulher, agora que pecaste!
Ah! Bendito o momento em que me revelas-te
O amor com teu pecado, e a vida com teu crime!
Porque, livre de Deus redimido e sublime,
homem fico na terra, à luz dos olhos teus-
Terra, melhor que o Céu! homem maior que Deus!

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